Estou há quase 24 horas pensando nas eleições chilenas. Li dezenas de artigos, pensei sob diversos ângulos. Não estou lá, é verdade, para ter uma opinião precisa sobre tudo o que ocorreu. Mas me permito reproduzir parte de um texto do blog de um camarada, Walter Sorrentino (www.vermelho.org.br/blogs/wsorrentino). Vai além das eleições e da visão maniqueísta de que o ocorreu no Chile, ocorrerá no Brasil. Mas traz bons elementos para reflexões.
"Piñera, no Chile, vence o 2º turno e é eleito novo presidente do país. Após 50 anos, a direita vence a eleição presidencial. A Concertación, no poder há 20 anos, cansou os chilenos que, há algum tempo, já´vinham votando em renovação. Ominami, candidato independente, foi a grande novidade desta eleição no 1º turno, alcançando 20% dos votos. Nem seu apoio ao candidato da Concertación no 2º turno levou Lagos – o candidato de Bachelet – à vitória.O resultado parece compor a vontade de mudança de padrões políticos no comando do Estado, com a continuidade de rumos do país. Em suma, um embate despolitizado, só modificado na reta final quando Concertación encosta na direita nas pesquisas. Piñera percebeu isso e explorou um discurso centrista, pragmático, sem entretanto romper com sua base. Boa parte do povo está cansada da política. Inscrição eleitoral no Chile não é obrigatória, de modo que quase metade da população não votou. Da metade que votou, 51% e algo deram a vitória a Piñera. Portanto, 25% da população em condições de votar deram um novo presidente da República.
Nas comemorações, cartazes de Pinochet nas ruas, o assassino de seu povo. Aos cem anos do massacre de Iquique, imortalizado na cantata de Quilapayun nos anos 1970, o Chile está na via da direita. Mau resultado, sobretudo se se levar em conta o equilíbrio de forças no ciclo progressista vivido na América do Sul. Embora, no caso do Chile, o país estivesse relativamente independente desse processo, e tendo definido de certo modo consensual seu modo de inserção particular na economia mundial.
Enquanto isso, impressiona o estratagema conservador em todo lugar do continente, incluído o Brasil. Fala-se abertamente de ameaça comunista, de tentativa de implantação de ditadura do proletariado, de ameaça à liberdade de imprensa, de manipulação dos direitos humanos como bandeira para o autoritarismo. O próprio FHC conclamou contra o “populismo autoritário” no Brasil. As conferências democráticas que elaboram políticas públicas no país, com ampla discussão desde a base, são tratadas como sectarismos esquerdizantes. A direita não se peja em fazer pregação anacrônica, manipulando os meios de comunicação monopolizados que detêm, para criar ambiente de suposta ameaça democrática, bolchevização do país. A falta de escrúpulos choca. Não é um enfrentamento fácil o que está em curso na América Latina. Na dúvida, há a IV Frota para atemorizar, os acordos militares que permitem aos EUA 7 bases na Colômbia. Enquanto isso, sob os auspícios dos EUA, em Honduras os golpistas não foram sancionados; no Haiti, a ajuda humanitária se transforma em demonstração de hegemonia norte-americana.
Há um grande paradoxo nisso tudo. Ao lado do ciclo progressista e desenvolvimentista em curso em vários países, suprimindo o paradigma do Consenso de Washington e mobilizando os Estados nacionais a impulsionarem o crescimento econômico, feito em bases democráticas em muitos casos jamais vividas, as sociedades vivem uma despolitização. Incorporando maiorias sociais ao processo político (como na Bolívia, Equador, Venezuela e mesmo Brasil), há uma espécie de diluição geral, onde a política e os partidos políticos cansam a maioria da população. A política se mercantilizou, vergada sob a evidência de que poderes reais da sociedade (finanças e, comunicações, particularmente) escapam às suas determinações, têm outro timing e outras conseqüências, mais tangíveis no plano da vida imediata da população. Não por acaso esses são exatamente os setores de ponta na contraofensiva que pretendem neste momento, e que não querem admitir nenhum tipo de controle social sobre seu papel.
Em 2010 e 2011 se define o destino do ciclo progressista no sub-continente e a eleição brasileira de outubro terá forte centralidade. A julgar pelo andar da carruagem, a direita esconde suas verdadeiras bandeiras, mas está ativíssima em retomar as rédeas do poder."
Nas comemorações, cartazes de Pinochet nas ruas, o assassino de seu povo. Aos cem anos do massacre de Iquique, imortalizado na cantata de Quilapayun nos anos 1970, o Chile está na via da direita. Mau resultado, sobretudo se se levar em conta o equilíbrio de forças no ciclo progressista vivido na América do Sul. Embora, no caso do Chile, o país estivesse relativamente independente desse processo, e tendo definido de certo modo consensual seu modo de inserção particular na economia mundial.
Enquanto isso, impressiona o estratagema conservador em todo lugar do continente, incluído o Brasil. Fala-se abertamente de ameaça comunista, de tentativa de implantação de ditadura do proletariado, de ameaça à liberdade de imprensa, de manipulação dos direitos humanos como bandeira para o autoritarismo. O próprio FHC conclamou contra o “populismo autoritário” no Brasil. As conferências democráticas que elaboram políticas públicas no país, com ampla discussão desde a base, são tratadas como sectarismos esquerdizantes. A direita não se peja em fazer pregação anacrônica, manipulando os meios de comunicação monopolizados que detêm, para criar ambiente de suposta ameaça democrática, bolchevização do país. A falta de escrúpulos choca. Não é um enfrentamento fácil o que está em curso na América Latina. Na dúvida, há a IV Frota para atemorizar, os acordos militares que permitem aos EUA 7 bases na Colômbia. Enquanto isso, sob os auspícios dos EUA, em Honduras os golpistas não foram sancionados; no Haiti, a ajuda humanitária se transforma em demonstração de hegemonia norte-americana.
Há um grande paradoxo nisso tudo. Ao lado do ciclo progressista e desenvolvimentista em curso em vários países, suprimindo o paradigma do Consenso de Washington e mobilizando os Estados nacionais a impulsionarem o crescimento econômico, feito em bases democráticas em muitos casos jamais vividas, as sociedades vivem uma despolitização. Incorporando maiorias sociais ao processo político (como na Bolívia, Equador, Venezuela e mesmo Brasil), há uma espécie de diluição geral, onde a política e os partidos políticos cansam a maioria da população. A política se mercantilizou, vergada sob a evidência de que poderes reais da sociedade (finanças e, comunicações, particularmente) escapam às suas determinações, têm outro timing e outras conseqüências, mais tangíveis no plano da vida imediata da população. Não por acaso esses são exatamente os setores de ponta na contraofensiva que pretendem neste momento, e que não querem admitir nenhum tipo de controle social sobre seu papel.
Em 2010 e 2011 se define o destino do ciclo progressista no sub-continente e a eleição brasileira de outubro terá forte centralidade. A julgar pelo andar da carruagem, a direita esconde suas verdadeiras bandeiras, mas está ativíssima em retomar as rédeas do poder."
2 comentários:
Realmente também me chamou a atenção a eleição chilena. Mas, devemos ficar atentos com as ele~ções brasileiras. A presidente chilena, mesmo com excelente aprovação de seu governo, não fez seu sucessor. E aqui, como será? Dilma emplacará? Tenho lá minhas dúvidas... Fiquemos atentos!!!
Olá, Manu!
Te vi numa matéria do CQC, há um mês atrás, mais ou menos. Fiquei muito feliz por saber que você venceu na sua categoria, até porque eu também votei em ti.
Admiro muito teu trabalho.
Beijos.
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