terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Para poetar Brasília...

Aqui em Brasília, apenas rapidamente passo pelo blog para deixar de presente para vocês esse poema lindo da Elisa Lucinda. Grande atriz, grante poetisa, linda figura humana. Recentemente, gravei um programa de TV que também contou com a participação dela. Ela passou o trajeto dos estúdios da emissora ao aeroporto tentando me ensinar a fumar o ar do cigarro imaginário. E jura que foi assim que parou de fumar: usando a imaginação.

A fúria da beleza

Estupidamente bela
a beleza dessa “maria-sem-vergonha”
soca meu peito esta manhã!
Estupendamente funda,
a beleza, quando é linda demais,
dá uma imagem feita só de sensações,
de modo que, apesar de não se ter a consciência desse todo, naquele instante não nos falta nada.
É um pá, um tapa, um golpe,
um bote que nos paralisa, organiza,
dispersa, conecta e completa!
Estonteantemente linda
a beleza doeu profundo no peito essa manhã.
Doeu tanto que eu dei de chorar.
Por causa de uma flor comum e misteriosa do caminho.
Uma delicada flor ordinária,
brotada da trivialidade do mato,
nascida do varejo da natureza,
me deu espanto!
Me tirou a roupa, o rumo, o prumo
e me pôs a mesa...
é a porrada da beleza!
Eu dei de chorar de uma alegria funda,
quase tristeza.
Acontece às vezes e não avisa.
A coisa estarrece e abre-se um portal.
É uma dobradura do real, uma dimensão dele, uma mágica à queima-roupa
sem truque nenhum. E é real.
Doeu a flor em mim tanto e com tanta força que eu dei de soluçar!
O esplendor do que vi era pancada, era baque e era bonito demais!
Penso, às vezes, que vivo pra esse momento
indefinível, sagrado, material, cósmico,
quase molecular.
Posto que é mistério,
descrevê-lo exato perambula ermo dentro da palavra impronunciável.
Sei que é desta flechada de luz
que nasce o acontecimento poético.
Poesia é quando a iluminação zureta,
bela e furiosa desse espanto
se transforma em palavra!
A florzinha distraída,
existindo singela na rua paralelepípeda esta manhã,
doeu profundo como se passasse do ponto.
Como aquele ponto do gozo,
como aquele ápice do prazer,
que a gente pensa que vai até morrer!
Como aquele máximo indivisível,
que de tão bom é bom de doer,
aquele momento em que a gente pede pára
querendo e não podendo mais querer,
porque mais do que aquilo
não se agüenta mais...
sabe como é ?
Violenta, às vezes, de tão bela, a beleza é!

Elisa Lucinda

1 comentários:

João Paulo disse...

Olá, muito legal seu blog. O poema é realmente bonito e bem estruturado.

Sou amigo de Samoel Rezende, que trabalhou com Olívio Dutra no Ministério das Cidades, lembra? Ele é conhecido de seu pai.

Abraço