O fato de minha mãe dedilhar as canções dele com perfeição criou minhas três irmãs mais velhas. Ela era uma jovem de 28 anos, três filhas, uma faculdade de direito abandonada para casar, um "desquite" antes da lei do divórcio, um violão, um piano e muito Chico Buarque. E muita dificuldade de Conseguir trabalho, e muita felicidade em existir. O que era uma mulher com três filhas e sem
Profissão, separada na década de 70?!? Para muitos, ela era a Geni.
Depois, encontrou meu pai. Voltou para o curso de direito e o Chico passou a ser a roda de violão na UFRGS com os amigos - enquanto as gurias também assistiam aulas.
Quando minha mãe passou no concurso de juíz e já havíamos nascido eu e meu irmão, Chico no violão passou a ser o único eixo permanente numa vida com tantas mudanças. De cidade em cidade íamos nós. Levávamos a roda de violão com os cinco em volta onde quer que estivéssemos.
Com Anos Dourados meu pai me tirava para dançar. Com Carolina, nos revelava seu talento para a criação (mentia ser o autor) Com "rua nascimento Silva 107, você ensinando pra Elisete" ele nos fazia cantar. Com "é gente humilde com cadeiras na calçada", ele chorava.
Com "se lembra da fogueira, se lembra dos balões" eles se separaram e nós mudamos mais uma vez de cidade.
Nós, com minha mãe, brigávamos para ser a segunda voz, o som da percussão com a boca, qualquer coisa entre ela, a letra e a música de Chico.
Cada música marcava um tempo e uma história de minha casa.
E assim seguiu. Fomos crescendo e as músicas foram nos tatuando, ficando em nossos corpos e mentes.
Chico me formou, garantiu justiça em muitas decisões de minha mãe, inspirou peças de teatro de minha irmã. Chico é o contexto de nossas vidas/textos.
Por isso, ontem quando o encontrei, me mantive estática pelo fato dele demonstrar saber quem eu era.
Dane-se o mundo e o padrão comportamental que julgam adequado para uma deputada federal.
Ao abraçar Chico - embasbacada -
Abracei o fato de minha mãe ter nos sustentado com seu violão e Chico.
Abracei todos os meus domingos de criança em rodas de violão.
Abracei as brincadeiras de meu pais.
Abracei os encontros e reencontros.
Abracei a todos os que amo e que, de alguma forma, amei.
Abracei minha vida.
Minha vida. Abracei mais a minha vida do que aquele homem maravilhoso com duas bolotas azuis no lugar de olhos.
terça-feira, 29 de novembro de 2011
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14 comentários:
Lindo texto. Você é muito chique, mesmo. Bota uma fotinho pra gente ver. Beijos. Sortuda!!!
Manuela, como filha de uma mulher que é tão admiradora de Chico, posso compreender um dos lados de sua vida, mas ainda assim ele não foi tão presente como foi para você. Muito bonito o modo que expressou seus sentimentos em torno de um compositor como Chico. E agora, lhe pergunto, que trecho de música, você descreveria nesse abraço?
Pensei nisso, Lolo. Seria a parte do tempo de delicadeza, de todo o sentimento
Eternamente Chico Buarque!
O melhor cantor e compositor brasileiro.
Posso imaginar sua imensa alegria ao encontrar com ele Manu.
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Fui um anônimo observador deste encontro. Em um rápido papo - não sou daqui, mas sou um eventual leitor do seu site - elogiei seu blog e falei da música que dá nome ao mesmo. Com este texto voce apenas reforça algo que eu intuía: Sensibilidade à 'flor da pele' e transparência em expor emoções à 'flor da terra'. Chico - homem e obra - nos faz melhores sempre.
Oi,
Claro que lembro de teu comentário. Apesar de estar catatonica.
Peço desculpas. A ti - pela falta de educação... E ele pela... Sei lá. Emoção saltitante....
Obrigada por passar aqui!
bonito ver a pessoa que existe por trás da política, da mulher de luta que és. bonito isso, manuela. quando li seus tweets confesso que pouco entendi. ainda não sei se tudo precisa ser tão exposto (digo mais por mim do que por ti, embora eu de pessoa pública não tenha nada). mas tenho de humano. de pessoa. e as vezes penso se preciso me expor. humano, demasiado humano. de qualquer forma, lindas, belíssimas palavras. emocionadas.
um beijo
izabel
lindo demais!!!
"Amores serão sempre amáveis. Futuros amantes, quiçá se amarão sem saber, com o amor que eu um dia eu deixei pra você!"
Fábio Rocha
tenho mais orgulho ainda de ter votado em vc...sua sensibilidade me emocionou..beijos....felicidades no ano que vem chegando
lindos, lindos, lindos! Você e o Chico!
Belo texto, combinação de sensibilidade e felicidade num depoimento comovente sobre lembranças, vida e família. E o que vale mais são os conceitos dos sentimentos. Curti, muito legal. Valeu !!!
Manu!!! Eu sou sua fã!!Além de toda a consciência política, é quase uma poeta!!!Fico feliz em saber que nosso RS está bem representado por ti!!!
Manuela,seu texto é uma expressão franca e direta, que tem o propósito explícito de fazer com que alguém se emocionar.Obrigada por essa emoção! Anajara PCdoB Gravataí
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