sábado, 3 de novembro de 2012

Cachos

"como pude ficarmos assim?", pergunta Quintana ao velho refletido no espelho.
Encontrei o balanço em que embalava meus sonhos. Ali sentei. Com um nó - daqueles que apenas os marujos sabem dar - minha garganta sufocou.
A menina que competia com o irmão caçula pela altura dos balanços, a menina que ia a missa para brincar no parque de diversões não reconheceu a adulta com olheiras profundas.
A vida fez com teus sonhos aquilo que faz com as mulheres que desejam nascer com o cabelo crespo. Transformou teus cachos em cabelo escorrido, disse a menina, fazendo a adulta chorar como criança.

4 comentários:

Anônimo disse...

Adorei!! Muito tocante e sensivel seu poema.

José de Arimatéa dos Santos disse...

Manu,
A vida é assim mesmo e cada lembrança da infância é o transporte para um mundo tão bom. Brincadeiras na rua ao ar livre e a descoberta de fabricar os brinquedos.
Chega a fase adulta e tanta responsabilidade... Essa é a vida!
Feliz!

Anônimo disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Anônimo disse...

O MESMO TEXTO COM A PONTUAÇÃO CORRIGIDA.
Assim todos ficam,Manuela. Você ainda possui uma memória de criança, de menina, para visitar; com balanços e gangorras, tais como os que via Portinari em Brodowiski e que eternizados foram em suas pinturas.
E as meninas que desejariam esquecer os seus passados ou que não saberiam dizer aonde se poderia encontrá-los?
A vida tem que ser vivida sem retrovisores, é o que me digo permanentemente.Por que sofremos em algum momento de nossas vidas, adultos, fingimos que éramos infinitamente mais felizes do que somos em criança.
Trata-se de uma mentira que contamos para nós mesmos. A criança que fomos morreu, para que pudéssemos converter-nos em adultos. Todas as crianças que vemos morrerão, algumas, entretanto, sem dar lugar ao adulto que poderiam ter sido em potencial.Seria justo que todas elas permanecessem indefinidamente crianças? E quantas delas não sonham em ser um dia adultas, fingindo poder encontrar no futuro uma saída para a vida sem futuro que levam? Nesse último caso, vislumbra-se a fantasia inversa: a nostalgia do porvir, de quem se vê esmagada pelo presente.
Olheiras, rugas , carapinhas brancas, celulites e pelancas , tudo, profundamente humano.
O existencialismo e o individualismo não nos permite a solução para o sentimento de perda que de tudo isso pode decorrer. Somente o humanismo poderá nos devolver a criança que fomos nas crianças que vemos. Como indivíduos, somos lamentavelmente finitos e frágeis ,"nuvem passageira", "cristal bonito que se quebra quando cai"; como espécie humana, podemos nos sentir eternos; se paralíticos, andar com as pernas dos nossos irmãos; se surdos, sentir a emoção dos que vemos ouvindo Mosart; se adultos, voltarmos a ser crianças nas crianças de que cuidamos.
O que passou ,passou! A luta continua! O passado só pode nos interessar no que tem de História, de lição, de experiência e aprendizado. Fora dessa perspectiva, é o que é: apenas tempo morto, infértil e ,às vezes, mórbido. O que importa é o hoje, mas não um hoje dos hedonistas a se verem morrendo a cada segundo,mas,sim, o hoje em que semeamos o futuro; mas não o futuro do individualista circunscrito em seu planejamento familiar, mas,sim, um futuro digno para toda a humanidade de que somos uma parte inseparável.